Celulares, laptops, tablets: os efeitos da superexposição infantil

É normal que pais de todo o Brasil registrem cada foto do crescimento de seus filhos. Fotografias, gravações, cartas, tudo se transforma em instrumento de recordação, postagens com bebês e jovens só parecem perder para fotos de animais. Outra situação normal é a de criança ou jovem com perfil próprio, postando tudo de forma constantemente para que um grande número de indivíduos possa ver, tendo a superexposição às telas e ao mundo digital como uma das consequências da pandemia do Coronavírus. Apesar do fato de parecerem inofensivas, essas demonstrações regulares podem expor seus filhos a riscos de diferentes tipos, com mais tempo em frente a computadores e celulares, crianças e adolescentes estão mais suscetíveis ao abandono digital. A questão é saber o limite entre o controle essencial e o exagerado. Saber observar entre o risco genuíno e o mal imaginado.

Na internet, veículo encontrado por muitos para diminuir a distância forçada pela quarentena, os registros de crianças e adolescentes são tão típicos ao ponto de ser difícil decidir se devem ou não existir nas redes sociais. Das fotos dos pais mostrando seus filhos aos perfis que as crianças abrem no Instagram para falar com o mundo, o mundo virtual há muito deixou de ser apenas para os adultos. Avalia-se que 86% das crianças já possuem perfil individual em algum tipo de rede social, a maior parte delas postando fotos de rosto e revelando nome e sobrenome, cerca de 24,3 milhões de crianças e jovens, segundo a pesquisa TIC Kids Online Brasil 2018, divulgada pelo Comitê Gestor da Internet no Brasil. A idade mínima exigida para um usuário fazer um perfil em qualquer rede social pode mudar de acordo com a regulamentação de cada nação, porém a maioria das plataformas permite que menores de 13 anos criem e mantenham um perfil individual. Seja como for, essa regra está longe de ser um empecilho para que o usuário minta sobre a idade para criar o perfil, independentemente de ter ou não consentimento dos pais. Essas redes sociais não foram criadas para crianças, e o próprio design acaba por induzir a superexposição. Quanto mais você postar e interagir, mais impulsos você terá para permanecer lá. Um grande número de jovens navega e entra em contato com conteúdos impróprios devido à ausência de controle parental suficiente que possa garantir a segurança durante a publicação. Ultimamente, não falta conteúdo produzido por jovens viralizando online, mas a questão está na dimensão e nos contextos que o conteúdo pode criar. Por dividirem o mesmo espaço, o conteúdo feito por crianças ganha tanto peso quanto aquele postado por adultos, criando, na exposição, cyberbullying e diferentes tipos de condutas predatórias comuns nas redes sociais, além de colocar crianças em contato com o consumo exacerbado, por causa dos anúncios, sem que eles possam perceber, em decorrência da ausência de educação sobre segurança nas redes.

Em correspondência com as preocupações com os conteúdos oferecidos pelos meios digitais à qual as crianças são expostas, existem também os perigos das ondas eletromagnéticas produzidas por equipamentos. Apesar de haver controvérsias do ponto de vista científico sobre os efeitos prejudiciais dos gadgets na memória, nos níveis de atenção e também de coordenação de crianças muito pequenas, já está demonstrado que a luz e a estimulação sonora transmitida pelas telas realmente implica em uma maior dificuldade para a mente encontrar o relaxamento de que necessita para descansar. A superexposição desde cedo de crianças a telas eletrônicas tem preocupado especialistas da saúde em todo o planeta. Independentemente de a exposição ser feita com supervisão, precisamos rever a tendência atual, que inexoravelmente tem mais telas e menos conexões e estímulos reais. A regra 3-6-9-12, proposta pelo especialista Serge Tisseron, em 2008, defende a abstenção absoluta de telas ou eletrônicos para crianças antes dos 3 anos. A partir dessa idade, a exposição é possível, porém de forma doseada, com a família e focada em exercícios instrutivos. O acesso a brinquedos adequados para cada faixa etária, fora do mundo virtual, bem como a interação com diferentes crianças e adultos é vital para dar os estímulos fundamentais para um bom desenvolvimento neuronal e mental, pois amplia a quantidade de sinapses (conexões entre as células do cérebro).

Ao lado do desenvolvimento cognitivo, contato com o mundo real é o que nos traz a estrutura psicoemocional importante para nos proteger dos impactos digitais, que atentem contra a autoestima. Em qualquer grupo de idade, o jovem é vulnerável a ficar deslumbrado ou aterrorizado por algo que assiste ou interage no campo virtual. Dessa forma, a atenção e a observação da família são essenciais, conversando, direcionando e prestando atenção nos conteúdos, auxiliando o jovem a enxergar o contraste entre o real e o virtual, falando sobre os perigos implicados nos contatos virtuais e mostrando que a família está disponível e irá apoiá-los. Por mais que a exposição possa ir de encontro com o poder dos pais, o peso não deve ser colocado apenas sobre os responsáveis. Por ser inconcebível impedir os jovens de frequentar esses espaços, por serem espaços públicos, as plataformas deveriam tornar esses locais mais acolhedores para as crianças. É um desafio para a empresa saber com precisão a idade dos indivíduos que estão se cadastrando, tendo em vista que a web não foi feita com um sistema de autenticação e identificação definido. No entanto, às vezes é possível distinguir a idade pela interação do usuário. No momento em que a rede social percebe que é uma criança, é importante criar componentes mais inovadores para tentar buscar o consentimento dos pais. Em uma circunstância extrema, ele trava tudo até que tenha o consentimento dos pais.

Ninguém vai considerar apropriado deixar uma criança na rua, sozinha, assim como não podem que os filhos conversem com estranhos. No entanto, infelizmente, os responsáveis regularmente não monitoram com quem seus filhos interagem na web, o que pode configurar um negligencia. Nos jogos on-line com vários jogadores disputando as mesmas partidas, não verificam quem são os parceiros de time, se são os mesmos amigos da escola ou são amigos virtuais O abandono digital está ligado à ausência de cuidados, principalmente quanto à ausência de informações sobre o uso dos recursos digitais. Depende dos responsáveis garantir a instrução para a vida digital, como fazemos para o mundo em que vivemos. As obrigações da autoridade parental aplicam-se tanto ao mundo real quanto à internet. O diálogo é fundamental para garantir a segurança de crianças e jovens na internet. Compreender a utilização que é feita de jogos e diferentes aplicativos na internet, estabelecer limites e esclarecer os propósitos por trás dos limites é crucial para construir um ambiente de uso responsável da tecnologia.

Seja qual for o país, capitalista ou socialista, o homem foi em todo o lado arrasado pela tecnologia, alienado do seu próprio trabalho, feito prisioneiro, forçado a um estado de estupidez. - Simone de Beauvoir

Postar um comentário

0 Comentários